Trago hoje mais uma vitória de nosso escritório, digna de ser compartilhada. Neste mês de novembro um amigo cliente conseguiu judicialmente (através de uma Medida Liminar -Antecipação de Tutela) a entrega das chaves de seu apartamento, que vinham sendo retidas pela construtora Decottignies sob a Alegação de existência de dívida contratual a ser ainda adimplida por ele - prática ilegal da construtora. Entendemos que a dívida cobrada é patentemente abusiva, ferindo o Código de Defesa do Consumidor e a Lei 10.931/2004, mas trataremos dela em tópico futuro, nos atentando, agora, para a ilegalidade da retenção das chaves.
Essa prática tem sido quase que unânime dentre as construtoras no Brasil, que condicionam a Entrega das Chaves imóvel à quitação de todos os se débitos do comprador junto a elas. Entretanto, tal prática não se justifica quando o comprador já houver, no curso do contrato, realizado Contrato de Financiamento Bancário com cláusula de Alienação Fiduciária do Imóvel.
Atualmente, todas as instituições bancárias ao financiar imóveis ("na planta ou não") o fazem através de um Contrato com Cláusula de Alienação Fiduciária. O instituto da Alienação Fiduciária de Bem Imóvel, regulado pela Lei 9.514/1997, que permite a utilização da alienação fiduciária de bens imóveis, para garantia de débitos civis.
A alienação fiduciária se caracteriza pela transferência, ao credor, da propriedade do bem garantidor, ficando o devedor com a simples posse direta, ou seja, o contato e a utilização direta do bem. Na prática, o devedor continua utilizando um bem que não mais lhe pertence. Uma vez paga a dívida, o devedor, automaticamente, volta a ser o proprietário do bem dado em garantia.
Nesse tipo de contrato, normalmente utilizado no mercado imobiliário, embora de forma não exclusiva, o adquirente do bem transfere a sua propriedade ao agente financeiro, pelo período que durar o financiamento.
No caso em tela, como forma de compelir
o autor a quitar seu “débito”, a Construtora ré estava retendo as chaves do
apartamento do autor, o qual está Alienado Fiduciariamente à
Caixa Econômica Federal, através de contrato devidamente
registrado no Cartório de Registro Geral de Imóveis da cidade de Vila Velha/ES, que confere ao Autor (comprador) a posse indireta do referido bem.
Sendo assim, a lei Lei 9.514/1997 e os dispositivos do Contrato firmado com a Caixa Econômica
Federal garantem ao autor a posse efetiva do imóvel. Além disso, não poderia a ré, Construtora Decottignies, reter as
chaves do imóvel objeto deste litígio a fim de compelir o autor a quitar sua
dívida nos termos por ela mesma impostos. Portanto,
tal retenção das chaves pela
construtora do Imóvel do autor alienado fiduciariamente à CEF configura-se
plenamente ILEGAL, abusiva e desproporcional, devendo
a requerida entregar as chaves do imóvel do autor e valer-se de outros meios legais para lhe cobrar seu débito.
Neste sentido, a Decisão Liminar exarada nos Autos do Processo 0021101-03.2015.8.08.0024, da 2ª Vara Cível de Vila Velha/ES que diz:
- "(...) verifico, nesse momento que, muito embora haja dissonância entre o valor da dívida, uma apresentada pelo autor e outra apresentada pelo réu, fato é que houve a assinatura do contrato de financiamento com a CEF, em que a própria construtora ré apôs sua firma, expressando a sua concordância e conhecimento no financiamento em tela, mesmo sabendo que o valor financiado não seria suficiente para o pagamento do saldo final. (...) Não pode, agora, a parte ré impedir que o autor adentre em seu imóvel sob a alegação de não pagamento do valor total do saldo final, isso porque, primeiramente, representaria a autotutela não abrigada pelo ordenamento jurídico, nem se enquadrando em suas exceções permissivas. Além disso, nem sequer é proprietária ou possuidora do bem, porque, uma vez assinado o contrato de financiamento, a nua-propriedade e a posse indireta do bem passa a pertencer à CEF, e não mais à construtura ré. Já a posse direta é dirigida ao autor, quem deve ser, de fato, imitido na posse de seu bem, não possuindo a parte ré direito de retenção de chaves na tentativa de cobrança. Portanto, e com as informações agora trazida pela parte autora, reconsidero aquela decisão de fls. 213, e DEFIRO os requerimentos antecipatórios. Expedir, pois, mandado de imissão de posse, para que seja o autor imitido na posse do imóvel objeto dos autos, sob pena de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais) para cada dia que a ré impedir a entrada do autor no bem, até o limite de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Citar e intimar." (Grifo nosso)